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27 de Junho de 2024
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    Violência obstétrica – Saiba como identificar e enfrentar

    Aproveitando o Dia das Mães, que este ano será celebrado neste domingo, 14 de maio, o Ministério Público do Paraná chama atenção para um tema de grande importância para a sociedade, em especial às futuras mães: a violência obstétrica, um problema que, segundo pesquisa publicada em 2010 pela Fundação Perseu Abramo, atinge uma em cada quatro brasileiras. Caracterizada como todo tipo de agressão, verbal ou física, sofrida durante a gestação, parto ou pós-parto, a violência obstétrica, aos poucos, tem deixado de ser um tema tabu para ser debatida e enfrentada.

    Mas ainda há muitos casos que não são denunciados. A promotora de Justiça Mariana Seifert Bazzo, responsável pelo Núcleo de Promoção da Igualdade de Gênero (Nupige) do MPPR, destaca alguns motivos para tal situação. “As vítimas de violência obstétrica ainda não se reconhecem como alguém cujos direitos foram violados, tanto por um aspecto cultural, já que a sociedade ainda ´'naturaliza' esse tipo de violência de gênero, como pelo próprio desconhecimento acerca da legislação que existe sobre o tema”, afirma.

    Repercussão – Os efeitos na vida das mulheres vítimas de violência obstétrica não se limitam ao aspecto físico. A psicóloga e psicanalista Fernanda Baptista, que atua no atendimento a gestantes e a mães no período pós-parto, alerta para a repercussão que o ato pode ter na vida das mulheres. “Práticas que colocam as mulheres como objetos que podem ser manipulados e desrespeitados, exatamente no momento em que elas precisam assumir um outro ser que vem ao mundo, podem ter impactos devastadores do ponto de vista psicológico. Muitas deixam de desejar ser mãe novamente, outras passam por sérias dificuldades em sua vida sexual”, comenta.

    A enfermeira obstetra da Universidade Federal do Paraná, Adelita Gonzalez, reforça a dimensão que uma situação violenta pode ter e a importância da adoção de posturas médicas que respeitem a futura mãe. “O uso inadequado ou abusivo de práticas de saúde pode gerar danos físicos, psicológicos e/ou emocionais às mulheres. Casos de real emergência devem ser considerados, entretanto tal situação não exime o profissional de manter conduta humanizada, respeitosa e ética, sempre informando e buscando a participação ativa dos envolvidos (mulher e familiar) na tomada de decisões.”

    Atuação do MP – A promotora de Justiça Michelle Ribeiro Morrone Fontana, que atua no Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Proteção à Saúde Pública, explica que o papel do Ministério Público na promoção da humanização do parto e no enfrentamento à violência obstétrica ocorre, principalmente, por meio de ações de conscientização e difusão de informações. “No último ano, participamos de diversas discussões que envolveram especialmente a classe médica e foi possível o esclarecimento de muitas dúvidas existentes a respeito do tema”, afirma. Além disso, na capital, é realizado acompanhamento junto às maternidades pertencentes à rede pública de saúde para verificação quanto à implementação das recomendações da Organização Mundial de Saúde para a abordagem do assunto. Nessa direção, está em curso na Promotoria de Justiça de Defesa à Saúde Pública de Curitiba procedimento administrativo por meio do qual será monitorado o cumprimento de tais diretrizes, assim como do Programa Mãe Paranaense. “A avaliação das maternidades é feita pela Secretaria Municipal de Saúde e os relatórios são apresentados ao Ministério Público para, nos casos em que são identificadas desconformidades, buscarmos soluções junto ao gestor público e às próprias instituições de saúde”, completou.

    Legislação – Em alguns países, como Argentina e Venezuela, a violência obstétrica é tipificada pela legislação como crime. Já no Brasil, a promotora de Justiça Michelle Fontana esclarece que não existe uma criminalização específica para esses casos. “É avaliado se a conduta tida como violência obstétrica se enquadra em algum dos tipos penais existentes, como lesão corporal, crime contra a honra ou omissão de socorro, cuja apuração e investigação compete ao Ministério Público”, explica. Michelle Fontana afirma, no entanto, que grande parte dos casos resultam apenas em uma responsabilização de ordem cível, que pode ser buscada por intermédio de advogado, Defensoria Pública ou diretamente pelo ofendido junto ao Juizado Especial; ou ético-disciplinar, aplicada pelos órgãos de classe, como os conselhos regionais de Medicina e de Enfermagem.

    Em termos legais, iniciativas vem sendo adotadas, tanto em nível federal como nas esferas estaduais e municipais no sentido de garantir a promoção de práticas de humanização do parto e combater a violência obstétrica. Em Santa Catarina, por exemplo, desde janeiro deste ano vigora lei estadual que trata da implantação de medidas de informação e proteção à gestante e parturiente contra a violência obstétrica no estado. Sobre a temática, o MP de Santa Catarina lançou campanha institucional que pretende mobilizar a sociedade e entidades relacionadas (conheça a iniciativa). No Paraná, Curitiba conta com lei municipal que dispõe de medidas de informação à gestante sobre a política nacional de atenção obstétrica e neonatal. A finalidade é a proteção às mulheres contra a violência obstétrica nas instituições de saúde da cidade.

    Parto Normal x Cesariana – Apesar de ter sua realização indicada somente nos casos em que exista real necessidade médica, as cirurgias cesarianas são comumente adotadas no Brasil como primeira opção no momento do parto, o que posiciona o país como líder entre os que mais realizam cesárea no mundo – 55,5% dos partos realizados. A realidade contraria o aconselhado pela Organização Mundial da Saúde (OMS), que limita em 15% o percentual desse tipo de procedimento.

    Dados divulgados recentemente, no entanto, apontam que, aos poucos, a realidade vem sendo modificada. Estatística do Ministério da Saúde mostra que, pela primeira vez, desde 2010, o número de cesarianas na rede pública e privada de saúde, apesar de continuar prevalecendo, não apresentou aumento no Brasil. Em 2015, o total de cesáreas caiu 1,5 ponto percentual. Dos 3 milhões de partos feitos no Brasil no período, 55,5% foram cesáreas e 44,5%, partos normais. Em 2016, a tendência de estabilização se manteve com o mesmo índice de 55,5% (dado preliminar). Considerando apenas os procedimentos realizados pelo Sistema Único de Saúde (SUS), os partos normais (59,8%) superam as cesarianas (40,2%). Em março deste ano, por ocasião das comemorações relativas ao Dia Internacional da Mulher, o Ministério da Saúde lançou documento que traz diretrizes de assistência ao parto normal no país. Confira a íntegra.

    Medianeira – No município de Medianeira, no Oeste paranaense, iniciativa da 2ª Promotoria de Justiça da Comarca busca acompanhar o cumprimento, por parte das unidades de saúde do município, das recomendações previstas em lei para a garantia de um parto humanizado e que respeite os direitos assegurados às mulheres. “Quando se fala em parto humanizado, a maioria das pessoas pensa em um parto domiciliar, na banheira, com doula (profissional que acompanha a gestante durante o período de gestação, no parto e nos primeiros meses após o parto buscando o bem estar da mulher), etc. e desconhece que humanizado é na verdade o respeito aos direitos, simplesmente”, lembra a promotora de Justiça Ana Claudia Luvizotto Batuli, que instaurou no último mês inquérito civil que objetiva combater práticas de violência obstétrica na localidade. A promotora destaca ainda a importância de as futuras mães terem acesso às informações necessárias. “Há direitos muito básicos que não são respeitados na hora do parto, como o de não passar por intervenções médicas cujas informações para autorização não foram prestadas. É preciso que as famílias sejam orientadas para que possam fazer escolhas conscientes. A ideia não é gerar um debate entre parto normal e cesárea, pois isso cabe à medicina, mas sim garantir que toda gestante e todo nascituro tenham seus direitos respeitados”, afirma.

    Como denunciar – No MP-PR, desde 2015, o canal para o recebimento de denúncias de violência obstétrica é o Núcleo de Promoção da Igualdade de Gênero da instituição (Nupige), estrutura vinculada ao Caop de Proteção aos Direitos Humanos. De acordo com o caso, as notificações são encaminhadas às Promotorias de Justiça do Estado, que contam com o suporte técnico do Caop de Proteção à Saúde Pública. Além disso, as denúncias também podem ser feitas nas promotorias de Justiça com atribuição na área da saúde ou ainda pelo Ligue 180 (Central de Atendimento à Mulher), pelo Disque Saúde 136 (Ouvidoria-Geral do SUS), junto à Defensoria Pública e aos conselhos regionais de Medicina (CRM/PR) e de Enfermagem (Coren/PR). Ainda o próprio hospital, clínica ou maternidade onde o fato ocorreu deve receber a reclamação e adotar as providências necessárias.

    MP no Rádio - Nesta semana, o tema da violência obstétrica também foi tratado no programa MP no Rádio que entrevistou a promotora de Justiça Andreia Cristina Bagatin, do Ministério Público do Paraná, que atua no Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Justiça de Proteção à Saúde Pública. Confira o áudio do programa.






















    Confira o vídeo da campanha:


    ♦ Tratar a gestante ou parturiente de forma agressiva, não empática, grosseira, zombeteira, ou de qualquer outra forma que a faça se sentir mal pelo tratamento recebido;

    ♦ Fazer graça ou recriminar a parturiente por qualquer comportamento como gritar, chorar, ter medo, vergonha ou dúvidas;

    ♦ Fazer graça ou recriminar a mulher por qualquer característica ou ato físico como, por exemplo, obesidade, pelos, estrias, evacuação e outros;

    ♦ Não ouvir as queixas e dúvidas da mulher internada e em trabalho de parto;

    ♦ Tratar a mulher de forma inferior, dando-lhe comandos e nomes infantilizados e diminutivos, tratando-a como incapaz;

    ♦ Fazer a gestante ou parturiente acreditar que precisa de uma cesariana quando esta não se faz necessária, utilizando de riscos imaginários ou hipotéticos não comprovados e sem a devida explicação dos riscos que alcançam ela e o bebê;

    ♦ Recusar atendimento de parto, haja vista este ser uma emergência médica;

    ♦ Promover a transferência da internação da gestante ou parturiente sem a análise e a confirmação prévia de haver vaga e garantia de atendimento, bem como tempo suficiente para que esta chegue ao local;

    ♦ Impedir que a mulher seja acompanhada por alguém de sua preferência durante todo o trabalho de parto;

    ♦ Impedir a mulher de se comunicar com o "mundo exterior", tirando-lhe a liberdade de telefonar, fazer uso de aparelho celular, caminhar até a sala de espera, conversar com familiares e com seu acompanhante;

    ♦ Submeter a mulher a procedimentos dolorosos, desnecessários ou humilhantes, como lavagem intestinal, raspagem de pelos pubianos, posição ginecológica com portas abertas, exame de toque por mais de um profissional;

    ♦ Deixar de aplicar anestesia na parturiente quando esta assim o requerer;

    ♦ Proceder a episiotomia quando esta não é realmente imprescindível;

    ♦ Manter algemadas as detentas em trabalho de parto;

    ♦ Fazer qualquer procedimento sem, previamente, pedir permissão ou explicar, com palavras simples, a necessidade do que está sendo oferecido ou recomendado;

    ♦ Após o trabalho de parto, demorar injustificadamente para acomodar a mulher no quarto;

    ♦ Submeter a mulher e/ou bebê a procedimentos feitos exclusivamente para treinar estudantes;

    ♦ Submeter o bebê saudável a aspiração de rotina, injeções ou procedimentos na primeira hora de vida, sem que antes tenha sido colocado em contato pele a pele com a mãe e de ter tido a chance de mamar;

    ♦ Retirar da mulher, depois do parto, o direito de ter o bebê ao seu lado no Alojamento Conjunto e de amamentar em livre demanda, salvo se um deles, ou ambos necessitarem de cuidados especiais;

    ♦ Não informar a mulher, com mais de 25 (vinte e cinco) anos ou com mais de 2 (dois) filhos sobre seu direito à realização de ligadura nas trompas gratuitamente nos hospitais públicos e conveniados ao Sistema Único de Saúde (SUS);

    ♦ Tratar o pai do bebê como visita e obstar seu livre acesso para acompanhar a parturiente e o bebê a qualquer hora do dia.

    Fonte: Ministério Público de Santa Catarina. Campanha “Combate à Violência Obstétrica”












































    ♦ Diretrizes de Assistência ao parto normal – Documento do Ministério da Saúde que objetiva reduzir as altas taxas de intervenções desnecessárias no parto e traz orientações a profissionais de saúde e mais informações às gestantes.

    ♦ Lei 11.108/2005 – Garante às parturientes o direito à presença de acompanhante, de sua escolha, durante o trabalho de parto, parto e pós-parto imediato, no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS).

    ♦ Lei 7.498/1986 – Regulamentação do exercício da enfermagem. Autoriza a realização do parto natural por enfermeiro obstetra.

    ♦ Resolução ANS 368/2015 – Dispõe sobre o direito de acesso à informação das beneficiárias aos percentuais de cirurgias cesáreas e de partos normais, por operadora, por estabelecimento de saúde e por médico e sobre a utilização do partograma, do cartão da gestante e da carta de informação à gestante no âmbito da saúde suplementar.

    ♦ Resolução ANS 398/2016 – Dispõe sobre a Obrigatoriedade de Credenciamento de Enfermeiros Obstétricos e Obstetrizes por Operadoras de Planos Privados de Assistência à Saúde e Hospitais que Constituem suas Redes e sobre a Obrigatoriedade de os Médicos Entregarem a Nota de Orientação à Gestante.









    * As imagens utilizadas na matéria foram cedidas pelo MPSC e integram a Campanha "Combate à Violência Obstétrica".
    05/05/17





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