Busca sem resultado
jusbrasil.com.br
27 de Junho de 2024
    Adicione tópicos

    As lições a serem tiradas do constitucionalismo antiliberal são abordadas em seminário

    há 11 anos

    Só podemos compreender a possibilidade do futuro da nossa Constituição e de garanti-la no que ela tem de bom se nós formos capazes de olhar para trás para vermos o que não pode mais continuar no Direito brasileiro, finalizou. A frase, proferida pelo professor da Universidade Federal Fluminense, Rogério Dultra dos Santos, resume o tema de sua palestra: O Constitucionalismo Antiliberal do Estado Novo e suas repercussões na Constituição de 1988, no seminário 25 Anos da Constituição Cidadã. O evento, promovido pelo Centro de Estudos Judiciários (CEJ) do Conselho da Justiça Federal (CJF), iniciado ontem (4), teve continuidade nesta quinta-feira (5), no auditório do Superior Tribunal de Justiça (STJ). O presidente da mesa foi o ministro do STJ, Humberto Martins.

    O professor levantou a discussão, assim, sobre até que ponto podemos retirar lições do que ele chamou de constitucionalismo antiliberal, ou seja, um conjunto de concepções teóricas concebidas para legitimar regimes autoritários. Algumas dessas concepções, segundo ele, permanecem arraigadas em nosso sistema normativo.Precisamos abrir um conjunto de reflexões sobre algo que até hoje não foi bem estudado os intelectuais que deram fundamentação à ditadura e cujas concepções ainda produzem efeitos hoje. Devemos estudar os nossos inimigos, afirmou. Um deles, de acordo com Dultra, seria o jurista Francisco Campos, que incorpora no Brasil um modelo de constitucionalismo que se opõe de forma radical à tradição do constitucionalismo liberal e social democrático.

    Rogério Dultra inicia sua exposição ressaltando que um dos fenômenos contemporâneos que mais tem chamado a atenção da opinião pública brasileira são as manifestações que tomaram as capitais do País, de uma espontaneidade que, segundo ele, não tem precedentes. O movimento Fora Collor, por exemplo, foi organizado através de forças sociais claramente identificadas. Não foi caso das manifestações de julho. A princípio, acredito que existia uma clara demanda por alteração do sistema político, de transporte, de educação, de saúde. Se pudéssemos condensar a miríade de opiniões, diríamos que há uma demanda por participação popular na vida democrática e por reformas de base, avalia o professor. Para ele, essas demandas oprimem a democracia brasileira e dizem respeito a reformas que foram reprimidas lá atrás.

    De acordo com Dultra, o Brasil nunca produziu de forma claramente identificável um processo de natureza revolucionária, que significasse uma ruptura com o modelo institucional. Esse processo, que ele chamou de conservar mudando, preservado inclusive na Constituinte de 1988, mantém elementos que vieram para a nossa ordem constitucional incólumes da ditadura. Como exemplos, ele cita dispositivos dos Códigos Penal e Processual Penal - o nosso sistema repressivo, como assinalou o professor. É o fato de nós hoje termos um excesso de prisões provisórias, pontua Dultra. Ele cita que, dos 500 mil presos hoje recolhidos nas prisões brasileiras, 46% são presos provisórios, em reclusão sem sentença condenatória. O professor acentua a necessidade de reformar a legislação processual brasileira, estabelecendo, por exemplo, prazos para as prisões provisórias.

    O constitucionalismo antiliberal, segundo Dultra, representa um movimento de forte crítica a questões políticas que estavam tomando conta do mundo ocidental nos anos 1920 e 1930 e que diziam respeito à possibilidade de representação política das classes populares organizadas. Ele ressalta que essa possibilidade não parecia interessante para as classes dominantes e por essa razão um sem número de juristas começou a criticar essa corrente, inclusive no sentido de impedir a ascensão do comunismo. E o remédio que veio a se constituir foi a reforma das bases intelectuais do constitucionalismo moderno para blindar a ascensão das classes populares.

    Assim, prossegue Dultra, uma onda de ditaduras vai assolar o mundo ocidental na primeira metade do século XX. A ascensão dessa normatividade, conforme salientou o professor, provocou a reforma da ordem constitucional de diversos países europeus com poder político concentrado. Essa nova ordem deveria garantir que determinados valores fossem compreendidos como necessários para a sobrevivência dessas comunidades, pontuou. Essa teoria da democracia, que segundo ele surge com o constitucionalista alemão Carl Schmitt, apregoa a identidade entre governante e governado. Isto, conforme explica Dultra, é o que dá a legitimidade à ditadura e afasta a necessidade do parlamento.

    Francisco Campos, além de teórico da Constituição de 1937, de acordo com Dultra, foi quem deu a ideia fundamental para que se estruturasse a legitimação do golpe militar de 1964. Ele observa que, não obstante a influência exercida pelo jurista em nosso sistema jurídico, entre os anos 1970 e 2000 encontrou apenas cinco trabalhos sobre ele, nenhum deles publicado. Essa tradição que é tão profundamente enraizada na nossa história recente e que permanece no processo constitucional nos anos 1980, traz hoje a nossa responsabilidade por identificarmos o que dela permanece, afirma o professor.

    Ao final da exposição, o ministro Humberto Martins registrou a grande contribuição dada pela juíza federal e professora Helena Elias Pinto na coordenação científica do seminário. Ela trouxe para este evento os craques do Direito, brincou o ministro.

    • Publicações19150
    • Seguidores13399
    Detalhes da publicação
    • Tipo do documentoNotícia
    • Visualizações750
    De onde vêm as informações do Jusbrasil?
    Este conteúdo foi produzido e/ou disponibilizado por pessoas da Comunidade, que são responsáveis pelas respectivas opiniões. O Jusbrasil realiza a moderação do conteúdo de nossa Comunidade. Mesmo assim, caso entenda que o conteúdo deste artigo viole as Regras de Publicação, clique na opção "reportar" que o nosso time irá avaliar o relato e tomar as medidas cabíveis, se necessário. Conheça nossos Termos de uso e Regras de Publicação.
    Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/noticias/as-licoes-a-serem-tiradas-do-constitucionalismo-antiliberal-sao-abordadas-em-seminario/100675478

    0 Comentários

    Faça um comentário construtivo para esse documento.

    Não use muitas letras maiúsculas, isso denota "GRITAR" ;)